Avaliação isolada da gestão de companhia e fraude a licitação
A análise detalhada da gestão de uma empresa e da competência profissional dos seus administradores, mesmo que tenha sido objeto de questionamento por parte da auditoria interna e da Controladoria-Geral da União, não é suficiente para comprovar a existência de dolo e nem tem qualquer influência na esfera penal, devido à falta de tipicidade adequada. A presença de dolo é um elemento fundamental para a caracterização de uma conduta criminosa, e sua ausência pode ser um fator determinante na absolvição de um acusado.
No entanto, a intenção, a vontade e o propósito dos administradores em cometer um ato ilícito podem ser avaliados com base em outros fatores, como a análise de documentos e a oitiva de testemunhas. A intenção de cometer um crime é um elemento importante para a caracterização do dolo, e sua presença pode ser comprovada por meio de provas robustas. Além disso, a vontade de agir de forma criminosa pode ser influenciada por diversos fatores, incluindo a pressão para atingir metas e a falta de controle interno. Em resumo, a comprovação do dolo é um processo complexo que envolve a análise de diversos fatores, incluindo a intenção, a vontade e o propósito dos administradores, e não pode ser feita de forma isolada. É fundamental considerar todos os aspectos para tomar uma decisão justa e garantir a segurança jurídica.
Introdução ao Caso de Fraude a Licitação
A 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (SP e MS) manteve a absolvição de 11 pessoas pelos crimes de fraude a licitação e peculato, apurados pela Polícia Federal na Operação Tritão. Oito réus integravam a cúpula da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), atual Autoridade Portuária de Santos (APS). O relator do recurso de apelação interposto pelo Ministério Público Federal, o desembargador federal Fausto De Sanctis, destacou que não há prova de dolo, ou seja, a vontade de desviar valores pertencentes à Codesp em proveito próprio ou alheio. Além disso, não se vislumbrou que os apelados tiveram a intenção de frustrar ou fraudar o caráter competitivo de procedimento licitatório, com o intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação — serviço de segurança no Porto de Santos mediante o monitoramento por drones, o que reforça a ideia de que o dolo não foi comprovado.
A licitação em questão foi vencida pela empresa Vert em 2018, sendo celebrado contrato com prazo de 12 meses, no valor de R$ 2,7 milhões. Segundo o MPF, os réus teriam desviado valores referentes a pagamentos por serviços que não chegaram a ser prestados pela ganhadora da licitação, causando prejuízos à administração pública. No entanto, o relator constatou que, por mais que tenha sido questionável o remanejamento de recursos para viabilizar a contratação, tendo em vista que à época a companhia se encontrava com fluxo de caixa deficitário, tal fato, por si, não apresenta qualquer relevância no meio penal, tampouco é suficiente para demonstrar o dolo de qualquer dos acusados, reforçando a importância da intenção e do propósito na avaliação do dolo.
Análise do Dolo e da Intenção
De Sanctis rejeitou as razões recursais do MPF e acolheu os argumentos dos advogados dos acusados, entre os quais o de que a homologação da licitação se baseou em pareceres técnicos de outros funcionários da Codesp. Os autores desses estudos de viabilidade não chegaram a ser denunciados pelo MPF. Segundo o relator, os pareceres não são ‘esdrúxulos ou desarrazoados’, não podendo ‘pequenos indícios’ servirem de prova de que os réus quiseram lesar a companhia, o que destaca a importância da avaliação isolada e da gestão de companhia na prevenção de fraudes. Além disso, tais vícios procedimentais não impediram que três empresas apresentassem propostas com valores próximos entre si, tendo a Vert vencido por ter o menor preço, o que sugere que a intenção e o propósito dos réus não foram necessariamente voltados para a fraude.
A Controladoria-Geral da União (CGU) e o Tribunal Regional Federal (TRF) têm papel fundamental na fiscalização e julgamento de casos de fraude a licitação, como o presente, onde o dolo é um elemento crucial para a condenação. A fraude a licitação é um crime que envolve a intenção de frustrar ou fraudar o caráter competitivo de procedimento licitatório, com o intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação. Nesse sentido, a avaliação do dolo e da intenção dos réus é fundamental para a decisão do caso, e a gestão de companhia e a avaliação isolada são instrumentos importantes para prevenir e detectar fraudes.
Conclusão do Caso
Com o recurso improvido, a sentença do juiz Roberto Lemos dos Santos Filho, da 5ª Vara Federal de Santos, foi ratificada. Ao rotular de ‘didática’ a sentença por ‘discernir a complexidade dos fatos narrados pela acusação’, De Sanctis acrescentou que o ordenamento jurídico veda a responsabilização penal objetiva. Desse modo, os acusados detentores de posição de direção na companhia não poderiam ser condenados apenas em virtude de sua posição, sem que houvesse prova de dolo, reforçando a importância da intenção e do propósito na avaliação do dolo. Além disso, não se comprovou qualquer comunicação pessoal ou conluio entre os acusados, enriquecimento ilícito, recebimento de vantagem indevida ou depósito sem origem comprovada em favor dos réus, o que sugere que a intenção e o propósito dos réus não foram necessariamente voltados para a fraude, e que a gestão de companhia e a avaliação isolada foram instrumentos importantes para prevenir e detectar fraudes.
Fonte: © Conjur
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