Jô Clemente recorda luta e transformação na Apae.
A minha jornada como mãe de um filho com deficiência foi marcada por desafios e obstáculos, mas também por momentos de superar e transformação. Meu filho, Zequinha, que nasceu com síndrome de Down, me ensinou a ver o mundo de uma forma diferente e a lutar por uma sociedade mais inclusiva, onde a deficiência não seja um impedimento para o desenvolvimento e a participação plena. A deficiência de Zequinha me fez perceber a importância de criar um ambiente acolhedor e acessível para todos, independentemente de suas habilidades ou limitações.
Ao longo do caminho, encontrei muitas pessoas que, como eu, estavam lutando para superar a limitação e a incapacidade que a sociedade impõe às pessoas com deficiência. O impedimento mais grande que encontrei foi a falta de compreensão e aceitação por parte da sociedade, que muitas vezes vê a deficiência como um obstáculo insuperável. No entanto, com a ajuda de profissionais e organizações que trabalham com deficiência, consegui superar esses obstáculos e criar um futuro melhor para Zequinha. A luta continua, mas estou orgulhosa de ter podido fazer uma diferença na vida do meu filho e de outras pessoas com deficiência. Juntos podemos criar um mundo mais inclusivo e acessível para todos. Vamos lutar por um futuro onde a deficiência não seja um obstáculo, mas sim uma oportunidade para o crescimento e o desenvolvimento. É possível criar um mundo melhor, e estou comprometida em fazer parte disso.
Introdução à Luta Contra a Deficiência
A dificuldade em encontrar uma escola que acolhesse o Zequinha e outras crianças como ele, que viviam com deficiência, despertou em mim uma indignação que se transformou em ação. Ao lado de quatro famílias que lutavam por oportunidades educacionais para seus filhos, idealizamos, em 1961, um espaço que pudesse suprir essa lacuna, enfrentando a limitação e a incapacidade que a sociedade impunha às pessoas com deficiência. Assim nasceu a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) de São Paulo, inicialmente um centro voltado à formação de profissionais de saúde, visando superar o impedimento que a falta de educação especializada representava para as pessoas com deficiência.
A urgência em oferecer educação especializada nos impulsionou a abrir nossas portas para as próprias crianças com deficiência, enfrentando a resistência inicial e a luta para mudar a percepção da sociedade em relação às pessoas com deficiência. Acreditávamos firmemente no potencial de cada pessoa — não importavam suas particularidades — e trabalhamos para superar a limitação e a incapacidade que a sociedade impunha às pessoas com deficiência. A formação de profissionais e a educação especializada foram fundamentais para a nossa missão de incluir as pessoas com deficiência na sociedade.
Desenvolvimento e Conquistas
A Apae cresceu com o apoio da comunidade, e duas iniciativas foram fundamentais para a nossa sustentação e visibilidade. A primeira foi a Feira da Bondade, idealizada com a colaboração de mulheres da alta sociedade paulistana, que generosamente vendiam produtos importados. Ela se tornou um evento aguardado e essencial para angariar os recursos que nos permitiram construir nossa sede em um terreno cedido pela prefeitura, superando o impedimento financeiro que poderia ter limitado nosso crescimento. Outra ação marcante foi o Agulhas da Alta Moda Brasileira, que reunia desfiles, bailes e jantares e chegou a congregar figuras importantes do meio financeiro, demonstrando o engajamento de diversos setores com a causa e ajudando a superar a limitação e a incapacidade que a falta de recursos representava.
Mas eu digo que uma das nossas maiores conquistas mesmo foi trazer para o Brasil, em 1976, o teste do pezinho, exame simples, feito em recém-nascidos, com um impacto gigantesco na detecção precoce de doenças que podem levar à deficiência intelectual e até mesmo a óbito, enfrentando a deficiência e a limitação que a falta de diagnóstico precoce representava. Foi um divisor de águas na saúde pública do país, permitindo que as pessoas com deficiência tivessem mais oportunidades de desenvolvimento e inclusão. A transformação e a luta para mudar a percepção da sociedade em relação às pessoas com deficiência foram fundamentais para o nosso sucesso.
Legado e Continuidade
Então, à medida que Zequinha crescia, vivendo de forma independente, com amigos e autonomia — algo raro para pessoas com síndrome de Down naqueles tempos —, minha preocupação se estendeu ao bem-estar dos que envelheciam com deficiência, enfrentando a limitação e a incapacidade que a idade poderia trazer. Em 1998, apoiei a criação de um centro especializado em estimulá-los nessa fase da vida, reconhecendo suas necessidades e trabalhando para superar o impedimento que a falta de apoio representava. Zequinha, meu filho amado, que se tornou um símbolo para tantos, partiu em 2001, aos 52 anos. Ao longo de nove décadas, pude testemunhar a transformação de um cenário em que a exclusão era quase regra para um presente em que artistas com síndrome de Down brilham na TV, no cinema e em exposições de arte, superando a deficiência e a limitação que a falta de oportunidades representava.
Em 2019, a Apae de São Paulo passou a se chamar Instituto Jô Clemente, e o mais gratificante nessa entidade que hoje leva meu nome é ver a continuidade da missão e seu impacto na vida das pessoas com deficiência, que continuam a enfrentar a limitação e a incapacidade, mas agora têm mais oportunidades de desenvolvimento e inclusão. O caminho que inauguramos culminou em mais de 18 milhões de testes do pezinho e na inclusão de ao menos 5 000 jovens no mercado de trabalho nos últimos doze anos, superando o impedimento que a falta de oportunidades representava e permitindo que as pessoas com deficiência tivessem mais chances de sucesso.
Fonte: @ Veja Abril
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